sábado, 15 de junho de 2013

Texto de Abertura

Um certo Miguilim  morava com sua mãe, seu pai e seus irmãos, longe, longe daqui, muito depois da Vereda-do-Frango-d’Água e  de outras veredas  sem nome  ou  pouco conhecidas, em  ponto  remoto, Mutúm.  No meio dos Campos Gerais, mas num covoão em trecho  de matas, terra preta, pé de  serra...
Da viagem, que durou dias, ele guardara aturdidas  lembranças, embaraçadas em sua cabecinha. De uma, nunca pôde se esquecer: alguém, que já estivera no Mútum, tinha dito: - “É um lugar bonito, entre morro e morro, com muita pedreira e muito mato, distante de qualquer parte; e lá chove sempre...”...
Amanhã, ia aparar água de chuva, tinha  outro gosto.  Repartia com Dito. O barulho da chuva agora era até bonito.
...   Miguilim esprimia os olhos.  Drelina e Chica  riam. Tomezinho tinha ido se esconder.
- Este nosso rapazinho tem a vista curta. Espera aí, Miguilim...
E o senhor tirava os óculos e punha-os em Miguilim, com todo o jeito.
- Olha, agora!
Miguilim olhou. Nem não podia acreditar! Tudo era uma claridade, tudo novo e lindo e diferente, as coisas, as árvores, as caras das pessoas.  Via os grãozinhos  de  areia, a pele da terra, as pedrinhas menores, as formiguinhas passeando no chão  de uma distância. E tonteava. Aqui, ali, meu Deus, tanta coisa, tudo...

                                                                                       João Guimarães  Rosa

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